domingo, 13 de dezembro de 2009

Carnaval IV – Chocalhos

Assim mesmo, no plural. Como na Biologia, são um gênero que abrange várias espécies: rocar, ganzá, xequerê , caxixi,... Seus múltiplos sons são diferentes entre si, mas têm algo em comum. Eles são a pimenta do bobó, o dendê da moqueca, a laranja da feijoada, o açúcar do café.
Sua presença não é fundamental, mas sem eles a música não tem graça. Quando agitados, dão vida às canções, imprimindo gingado, suingue, malícia e improviso. Fazem os acordes mais leves e espontâneos.
Para quem escuta, é mais do que isso, representa a tradução musical da dança. É o arrastar dos chinelos no salão, o roçar sensual das barrigas que se tocam ou o tímido jogo de ombros da cabrocha faceira.
Encanto-me em descobrir as levadas. Experimentar os sons dos diferentes tipos de areia e semente dentro do oco cilindro de alumínio ou da cestinha de palha. Chacoalhar as miçangas fora da gorducha moranga, achar a matemática certa para coincidir com os tempos da música... e percebo que sou destra na arte do agitamento rítmico! Como uma coisa tão simples pode ser tão importante e dar tanto prazer? Considero ser esta uma nova possibilidade de linguagem, tendo nas mãos instrumento que é, na realidade, uma continuação do meu corpo e que fala por si.
Às vezes, me desligo, entro em transe, instintivamente toco e vejo no que dá. Em geral é quando toco melhor. É só cair em mim e perceber o que estou fazendo que me dá um curto-circuito cerebral, me descoordeno e começo a errar.
Dependendo da música, pode ser uma atividade absolutamente extenuante, samba e quadrilha, principalmente. É um ritmo tão acelerado que antes de começar, tenho sempre a impressão que não vou conseguir. Depois de alguns minutos, o braço começa a queimar e a ficar duro. A musculatura peitoral também fica dolorida, um calor infernal, respiração ofegante, suor brotando de todos os poros, o rosto corado pelo esforço. Praticamente um exercício aeróbio, uma corrida, um pique de duzentos metros. Ainda bem que não é o tempo todo assim, e as levadas mais calmas compensam e permitem o breve descanso.
Sua pegada deve ser leve, deixando o instrumento solto nas mãos, livre para criar. Aproveitar cada movimento de ida e volta, ele pode estar como pode não estar. E quando está, é de forma ao mesmo tempo despretenciosa e marcante, expressiva. É uma combinação de seriedade com brincadeira, praticamente impossível não notá-lo.
No rocar, as platinelas fazem um barulho extremamente alto, dependendo do lugar onde esteja acontecendo, podem realmente ser incovenientes. Mas, onde estou, no coração da bateria, cercada na frente pelos alegres tamborins, nos lados pelos agogôs, atrás pelas caixas e repiques e ao fundo pelos potentes surdos, ignoro qualquer desconforto. Ouço tudo harmonicamente e doso, na medida certa, o meu precioso tempero nesta salada musical.

Um comentário:

  1. SENSACIONAL, Dani. AMEI o texto!

    Conseguiu traduzir exatamente a sensação que dá na hora de tocar!!!!!!

    bjoka garota!

    ResponderExcluir