quarta-feira, 21 de março de 2012
No balanço
O menino saiu da escola sozinho na hora do recreio e foi para a praça. A inspetora falou que precisaria da autorização dos pais, mas ele alegou um imprevisto familiar. Não foi muito difícil de conseguir a liberação, afinal de contas não costumava faltar aulas e, apesar da aparência, ele já estava na sexta série. Fazia sol e as amendoeiras faziam um moteado de sombras. Apesar de ser dia de semana, algumas crianças brincavam e carrinhos de bebês estavam estacionados de frente para o parquinho. Próximo a uma árvore, deixou sua mochila, camisa do uniforme e tênis, ficando apenas com uma bermuda amarela, presente da avó.
Nesse dia, o menino estava incrivelmente triste. Não queria conversar com ninguém, não queria fazer nada. Pensava na sua vida e o que fazer com ela. Não eram pansamentos de gente da sua idade, mas como era precoce em quase tudo, refletiu, não haveria de ser um problema. Seu pai deixou sua mãe com dois filhos ainda pequenos, e desde que se lembra, nunca foi um exemplo de provedor. Pelo contrário. Como seu pai precisava se encontrar, decidira fazer um curso nos Estados Unidos, e para se manter lá gastava muito. Não tinha como mandar um fixo para a ex-mulher e filhos. A vida vai passando, até que ele resolve voltar.
E o faz com um sorriso nos lábios e uma gringa a tira-colo. Ele não engole a branca-azeda e não se esforça em ser simpático. Sua mãe nunca superou o trauma do abandono, e seu irmão já esteve internado diversas vezes por problemas de saúde. Uma coisa ele aprendeu cedo: não podia contar com ninguém. Outra conclusão difícil de se tirar tão jovem, ainda mais quando se ama os demais.
Essa noite era o jantar com todos dessa família moderna e ele não queria ir. Melhor seria se ficasse jogando vídeo-game a noite inteira até cair por cima das almofadas no chão da sala. O que ele poderia fazer para evitar esse encontro desagradável? Sabia que seria uma situação incômoda para todos. Um velho que jogava dama na mesa da praça percebeu que ele não brincava com as outras crianças e com um brilho nos olhos deduziu: poeta!
O menino sentou no balanço, e pegando impulso com as pernas. No início lento, como quem não quer nada, mas depois foi pegando cada vez mais impulso e gostava do vento refrescando seu rosto. Foi tentando chegar à máxim altura possível. Tudo ao seu redor estava fora de foco e nada mais eram que riscos coloridos. A velocidade do balanço ele fazia com que a realidade em sua volta se tornasse sem importância. Sua vida seria congelada naquele instante. Foi quando, então, ele passou a jogar seu corpo para um lado e para outro, fazendo as correntes se cruzarem até ele tocar os pés de volta ao chão.
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