Pequena, pesada, preta com detalhes prateados. Esferográfica azul, macia. Metade do seu corpo gira e ... voilá! Pronta para usar. Sobre o que escrevo? Qualquer coisa. O tudo. O nada. O que passaria despercebido, o que de mais importante há no ser, o cerne da questão. O que representa? A estruturação do raciocínio de quem estava completamente sem norte, de quem pensava em um milhão de coisas de uma vez. A calmaria depois do furacão. A reconstrução.
- Calma, eu digo para mim mesma, vamos ver se consigo me expressar.
Me impressiono com o resultado. Nem eu sabia que era capaz. Gostei. É a valorização do eu. As questões agora são palpáveis na forma de um título e algumas linhas. Esses papéis fazem parte de mim e eu pertenço a alguma coisa. É uma das atividades mais solitárias, mas me sinto de certa forma acompanhada. De quem? A quem interessaria? Não importa. A mim mesma.
Escrever no computador? Nem pensar! Primeiro que não teria meus manuscritos. Qualquer pessoa poderia escrever meus textos. Perde um pouco de mim. E, nesse momento, quero me descobrir por inteira. Segundo que tem a questão do tempo, que seria diferente. Enquanto escrevo estou pensando, tudo em harmonia, e as idéias surgem naturalmente. Terceiro que posso escrever em qualquer lugar. Na cama, no sofá, na mesa. Não dependo de energia, memória, antivírus, pane geral... estou imune a tudo. É a liberdade plena.
São quatro da manhã e fui acordada pelas minhas idéias. Tenho que me levantar e despejá-las rapidamente no papel. Não consigo dormir. Estou na cama sozinha, nua. Estou preocupada. Amanhã, digo, hoje tenho que acordar cedo.
É inevitável. Me levanto, pego o caderno vermelho e... ah, meu Deus, perdi! Onde está? Subitamente meu coração palpita e começo a procurar. Não seria capaz de escrever com mais nenhuma. Não da mesma forma, fluência, como que numa conexão direta cérebro- coração- mão- tinta. Só com ela. Onde está? Ufa! Debaixo do travesseiro. Que bom! E respiro mais aliviada. Posso prosseguir com meu instrumento libertário. Posso dormir em paz.
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