Simples assim. É o aumento da temperatura corporal. Tem inúmeras causas e por isso intriga e ameaça os médicos. De que o indivíduo sofre? Por que não consigo descobrir? Torna-se uma espécie de atestado de incompetência profissional. É uma ferida aberta no peito dos vaidosos deuses da arte de curar.
E, como tudo na medicina, quando não se encontra a causa, a culpa é sempre do mais fraco, a culpa é do doente. Diferente dos leigos, no meio médico não se diz que a pessoa teve ou apresentou febre. É mais cômodo falar que o paciente fez febre. Ora, que injustiça! Que covardia daqueles que exercem sua vocação através do cuidar! Agora, além de padecer da sua enfermidade, de sofrer com seus sintomas e tormentos, o paciente é também responsável por ela? Ele faz a febre. A fabrica. Ele é o responsável.
Mas não, as estrelas de branco não podem ser ofuscadas por um sintoma tão antigo e banal. Por isso, de cima de seu pedestal sagrado lançam mão de suas armas: antibióticos, é claro. Mas será que eles farão efeito? Será que debelarão a terrível moléstia? Não se pode transparecer a dúvida ou insegurança.
E, por isso, utilizam as palavras mais difíceis, as linguagens mais ininteligíveis, criam neologismos, verbos, enfim, uma nova língua, afinal, eles podem.
- Ele defervesceu? Já foi identificado o germe? Podemos desescalonar o antibiótico?
Não é nada fácil. É preciso muita criatividade para manter a pose e a impressão de que tudo está sob controle.
Sim, doutor, a febre cessou, parece que a doença está controlada. Imediatamente seu ego se infla novamente. Ele levanta sua sábia cabeça, outrora pensativa e sorri aliviado. Ganhou mais uma batalha. E então vem a pergunta:
- Até quando manter o tratamento?
A resposta exige ciência, muito estudo e também experiência. Ele já mostrou seu dom, todos reconheceram. Então ele pára por um minuto e pensa: manter por um número de dias múltiplo de sete e nunca suspender na sexta-feira.
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